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Quinta-feira, 02 de maio de 2024

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entrevista da semana

Sindalcool afirma que é urgente União se decidir sobre uma matriz energética nacional

Há 38 anos morando em Mato Grosso, o diretor executivo das Indústrias Sucroalcooleiras de Mato Grosso (Sindalcool-MT), Jorge dos Santos, veio para o estado para gerir a extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Sua extensa trajetória em setores da economia voltados para o trabalho no campo o levou ao cargo de representatividade que ocupa hoje.

Foto: Reprodução / Ilustração

diretor executivo das Indústrias Sucroalcooleiras de Mato Grosso (Sindalcool-MT), Jorge dos Santos

diretor executivo das Indústrias Sucroalcooleiras de Mato Grosso (Sindalcool-MT), Jorge dos Santos

Há 38 anos morando em Mato Grosso, o diretor executivo das Indústrias Sucroalcooleiras de Mato Grosso (Sindalcool-MT), Jorge dos Santos, veio para o estado para gerir a extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Sua extensa trajetória em setores da economia voltados para o trabalho no campo o levou ao cargo de representatividade que ocupa hoje.

Em entrevista ao Agro Olhar, foi sucinto ao falar sobre o principal problema enfrentado pelo setor atualmente: “precisamos de um posicionamento claro do Governo Federal sobre qual matriz energética o País irá adotar”.

Santos analisa que o direcionamento de todos os esforços da União para ‘salvar’ a economia brasileira com os possíveis lucros obtidos a partir da exploração do Pré-Sal não justifica o abandono de grande parte dos 156 projetos iniciados em 2008 que apostam no etanol como matriz energética mais viável.

O diretor executivo versa sobre os principais empreendimentos energéticos ativos ou em andamento no País, que compõe o Plano Nacional de Energia 2030. “É preciso que o governo garanta a segurança do suprimento de energia elétrica e promova ações como a redução dos valores da conta de luz, mas de forma responsável, sem prejudicar a sociedade e inviabilizar o trabalho de indústrias e setores como o sucroenergético”.

Destaca ainda que é possível traçar estratégias e definir políticas que garantam a segurança e a qualidade do suprimento energético, mas que para isso é essencial que o Planalto esteja aberto a trabalhar em conjunto com as classes e entidades representativas dos setores afim. “O Governo deve deixar de lado essa postura de tutor e assumir um posicionamento indutor”, observa Jorge dos Santos.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

Agro Olhar – Como nasceu o setor sucroalcooleiro em Mato Grosso?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – Em 1966 surgiu a primeira usina, a usina de Jaciara, que saiu do papel como um projeto público. No rastro vieram a Itamarati e a Barralcool. A primeira durante décadas reinou como a maior indústria sucroalcooleira do mundo, posição perdida há apenas dois anos. Com os programas desenvolvidos na década de 70 como o uso do álcool, o ‘combustível brasileiro’, por meio do Programa Nacional do Álcool (Proálcool); e do projeto de integração nacional ‘Integrar para não Entregar’, que incentivava produtores da região Sul a se instalar e povoar Mato Grosso, o plantio da cana-de-açúcar experimentou um crescimento vertiginoso.

Agro Olhar – Fale sobre o papel do Pro-Alcool neste contexto.

Diretor Executivo Jorge dos Santos – O Proálcool, criado em 1975, foi a possibilidade de muitos produtores mudarem de ramo. A partir do início da década de 1970, especialmente depois da crise energética desencadeada pelo “choque do petróleo” de 1973, o governo pressionado por um lado, pelos usineiros, então endividados via Fundo Especial de Exportação, e por outro, pelas fábricas de equipamentos industriais do ramo, as quais tinham se estruturado para fazer frente ao Programa de Racionalização da Agroindústria Açucareira/Alcooleira, abriu mão do programa para alavancar a economia do País. Confeccionado com o objetivo de aumentar a produção de safras agroenergéticas e a capacidade industrial de transformação, assim como a obtenção de álcool para a substituição da gasolina e o incremento no uso do setor químico, o álcool deu novo fôlego ao setor sucroenergético.

Agro Olhar – Por que usar o etanol?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – Um levantamento feito pela União Europeia sobre emissões globais de CO² no uso de combustível fóssil e produção de cimento, publicado 2012, mostra que o exitoso programa de biocombustível iniciado nos anos 1970 com o Proálcool e diversificado com a implantação do programa brasileiro de biodiesel em 2007, rendeu ao Brasil status de país preocupado com a o meio ambiente, que preza pela preservação dos ecossistemas e pelo bem estar de sua população.

Agro Olhar – O que isto significa na prática?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – Que vivemos muito melhor porque usamos um combustível que infinitamente menos agressivo que os fósseis. Os números brasileiros de emissão absoluta, per capita ou por unidade do Produto Interno Bruto (PIB), são baixíssimos. O Brasil tem uma das matrizes de energia mais limpas do planeta e se destaca no consumo de biocombustíveis, com volume próximo ao alcançado pelos 27 países da União Europeia. Consumimos de biocombustível (etanol e biodiesel), no uso de transporte terrestre, em 2011, 479.400 TJ. A União Europeia consumiu, no mesmo período, 555.120 TJ. Em termos per capita, o Brasil consumiu 2,44 TJ por habitante, mais que o dobro de 1,13 TJ registrada na União Europeia. É isto que significa optar pelo etanol como principal matriz energética.

Agro Olhar – Então o uso destes biocombustíveis (etanol e o biodiesel) serve de exemplo para o mundo?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – Sim. Os biocombustíveis contribuem efetivamente para a redução da emissão de carbono, e o Brasil é um exemplo prático da chamada economia verde. Hoje somente 30% dos nossos veículos usam o etanol. Este número já chegou a 65%. Mas temos o que comemorar. Somos a única nação do mundo que pode fazer a escolha pela mistura de dois combustíveis (álcool e gasolina). Mas o setor ainda se recente de políticas públicas voltadas para nossos biocombustíveis.

Agro Olhar - Qual é a situação atual do setor sucroalcooleiro no Brasil?

Diretor Executivo Jorge dos Santos - Indefinida. Reunimos-nos com a presidente Dilma Rousseff em 2011, tão logo ela assumiu o poder, para discutir as políticas voltadas para o setor. Obtivemos uma resposta positiva de continuidade da maioria dos 156 projetos iniciados em 2006, quando havia uma percepção mundial de que o etanol seria a salvação do planeta, justamente por ser um combustível limpa, que polui 82% menos que os combustíveis fósseis, obtidos a partir da extração do petróleo. Hoje, somente 58 destes projetos estão em andamento. Até a década de 90 o setor era regulado pelo setor público. O governo Collor mudou isto. Passamos a nos equipar com maquinários modernos, a evoluir. Antes, o provado só produzia. No início dos anos 90 houve uma abertura. Isto resultou num desenvolvimento do setor que refletiu num amadurecimento do mercado.

Agro Olhar – A política costurada em Brasília privilegia quais setores que visam dar suporte ao suprimento energético?

Diretor Executivo Jorge dos Santos - Belo Monte, Parque Eólico de Osório, Interligação Manaus-Boa Vista, Linhão Tucuruí-Macapá-Manaus, Angra 3, Interligação Madeira-Porto Velho-Araraquara e algumas obras e projetos na área de Petróleo e Gás Natural são listadas, pelo própria União, como os principais empreendimentos que estão sendo executado pelo Governo Federal. Nenhum deles trata da exploração e uso do etanol e biodiesel. Não há nada que nem de longe se pareça com o Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-Açúcar (Planalsucar), que surgiu para financiar a modernização do parque de usinas e destilarias, lá nos idos de 1971. Naquela época se previa desde o desenvolvimento de novas variedades de cana até a projeção de safras, além de uma série de estudos do avanço da cana, que estavam prontos antes mesmo de surgir o programa que alavancou definitivamente a produção do etanol no País.

Agro Olhar – A descoberta do Pré-Sal fez com que o projeto dos biocombustíveis caísse no esquecimento?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – O projeto, quando começou, tinha ninguém menos do que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como principal padrinho, que sonhava transformar o País em referência mundial. Mas o sonho se evaporou assim que o Pré-Sal foi descoberto; e é bom lembrar que nem sabemos ainda se a exploração dele é possível, por conta da profundidade em que se encontra e outras variáveis.

Agro Olhar – Existem outros benefícios no plantio da cana-de-açúcar além da produção de um combustível limpo?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – O investimento do setor sucroalcooleiro tem resgatado áreas degradadas, o setor gera 15 mil empregos diretos e quatro vezes mais indiretos; 70% de nossa colheita já é feita de forma mecanizada, contribuindo de forma significativa para a saúde dos trabalhadores do campo, que tem passado por uma série de capacitações, resultado de parcerias formadas com o Sistema S; após ser destilado o melaço produz a vinhaça ou vinhoto, e este serve de fertilizante natural, usado na irrigação das plantações; o bagaço é usado na geração de energia e o excesso é vendido para o mercado; o uso de água diminuiu consideravelmente e os projetos que o setor tem apresentado nos últimos 20 anos para tem contribuído para uma melhora no perfil sócio ambiental do país de forma significativa.

Agro Olhar – O setor de biocombustíveis é ocioso?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – Sim, e isso se deve ao fato de a demanda ainda é menor do que a capacidade de produção. Há um marco regulatório do Governo Federal que determina a mistura de apenas 5% de biodiesel no diesel mineral. Mas, hoje, poderíamos suprir o dobro dessa cota, adicionando 10% na mistura. Para que isso ocorra, precisamos de uma lei ampliando o percentual máximo.

Agro Olhar - O que aconteceu de 2006 para cá?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – Em 2006 o governo brasileiro estudava a criação de "programas agroenergéticos integrados", que estariam dispostos a receber o capital estrangeiro, e que estes programas permitiriam aos brasileiros manter a propriedade da terra, e que somente a produção industrial seria controlada pelos estrangeiros. O etanol, obtido a partir da cana-de-açúcar, se tornava cada vez mais popular, mesmo nos Estados Unidos (onde é produzido com base no milho), por ser menos poluente que a gasolina e muito mais barato. O mundo se interessou pelos biocombustíveis brasileiros. Contudo, ocorreu uma mudança de postura da presidência, que hoje só tem olhos para o Pré-Sal. E o que o governo deixou de lado está sendo gerido por multinacionais como a Bunge e a ADM, que tem conhecimento tanto da potencialidade econômica do etanol bem como de sua viabilidade sócio ambiental.

Agro Olhar – E existe viabilidade no projeto do Pré-Sal?

Diretor Executivo Jorge dos Santos – A Petrobras anunciou a descoberta do petróleo no Pré-sal (abaixo de uma camada geológica de dois quilômetros de espessura de sal) em 2008. O governo vê nesta matriz grande potencial, e acredita que ele colocará o Brasil no mesmo nível de reserva dos grandes produtores mundiais. Porém cerca de 70% da produção brasileira é de petróleo mais pesado e a estrutura de refino não é totalmente adequada para o processamento desse tipo de óleo. Temos que avançar muito neste campo. Ainda hoje importamos petróleos leves, para aumentar a produção de derivados leves e médios, como gás de cozinha, gasolina, nafta petroquímica e óleo diesel. A Petrobras está modernizando seu parque de refino para elevar a capacidade de processamento de petróleo pesado e de produção de derivados que ainda precisam ser importados. Mas quando falamos de etanol, estamos nos preparando desde a década de 70, o que torna óbvio a opção pelo etanol como matriz energética nacional.
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