O boi, o pasto, a lavoura e a floresta manejados de forma diferente. Não mais isolados, mas integrados numa mesma área em busca de ganhos produção, produtividade e de algo ainda mais ambicioso em tempos de mudanças climáticas: a redução de gases de efeito estufa no setor rural. Com essa meta, o governo federal começou a implementar, em setembro de 2011, o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono). Hoje, 19 estados e o Distrito Federal têm planos ABC regionais. Agora, essa política pública também passou a despertar o interesse de municípios.
Dono do maior rebanho bovino brasileiro, com 2,2 milhões de cabeças, São Félix do Xingu, no Pará, é o primeiro município do país a criar um comitê local do ABC e a pedir o apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para planejar suas ações. “Isso mostra o sucesso do plano”, diz o coordenador de Manejo Sustentável dos Sistemas Produtivos da Secretaria de Produtor Rural e Cooperativismo do Mapa, Elvison Ramos.
De acordo com ele, o ABC nacional – uma das prioridades da gestão da ministra Kátia Abreu – não prevê a adesão dos municípios, mas a iniciativa de São Félix do Xingu aponta para um cenário promissor. “O ideal é que os municípios também comecem a se interessar por essa política pública de ações sustentáveis.” A redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE), observa, é um compromisso assumido pelo Brasil durante a COP15, na Dinamarca, em 2009.
Esta semana, Elvison Ramos esteve reunido com representantes da ONG The Nature Conservancy (TNC), que apoia o comitê municipal do Plano ABC de São Félix do Xingu por meio de parceria com a prefeitura. O grupo obteve a garantia de que o Mapa contribuirá na elaboração do Plano ABC local. Na segunda quinzena de março, o ministério participará de um seminário na cidade.
O evento reunirá prefeitura, sindicato rural, associações de produtores, academia, extensão rural púbica e privada e outras entidades envolvidas com a produção agropecuária para debater o planejamento das ações a serem desenvolvidas, como metas de redução de emissão de gases de efeito estufa, capacitação e uso de tecnologias mitigadoras de GEE.
O comitê municipal do Plano ABC foi instituído no final do ano passado, com a edição do decreto que criou o Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura do Município de São Félix do Xingu. A meta é reduzir as emissões de gases de efeito estufa em São Félix – no sul do Pará – para melhorar a eficiência no uso de recursos naturais e aumentar a resiliência dos sistemas produtivos e de comunidades rurais, além de possibilitar a adaptação do setor agropecuário às mudanças climáticas.
Pecuária sustentável
O interesse de São Félix do Xingu em ter a versão municipal do Plano ABC – o primeiro passo foi a criação do comitê – decorre de sua forte vocação para a pecuária, segundo o coordenador de Produção Sustentável da ONG TNC, Francisco Fonseca. O gado emite gás metano, potencialmente um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global. Com cerca de 8 milhões de hectares, o município também tinha alto índice de desmatamento, o que começou a ser revertido a partir de 2009.
A parceria entre a prefeitura e a TNC já resultou na criação de 15 unidades demonstrativas do ABC, voltadas à pecuária, e três em áreas de cultivo de cacau. Segundo Fonseca, a proposta é fazer com que os produtores do município visitem esses locais para conhecer as tecnologias da política pública. “Queremos sensibilizá-los para que venham a desenvolver a agricultura de baixo carbono”, reforça o coordena dor da ONG. Atualmente, São Félix tem 6 mil agropecuaristas registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Um contingente de cerca de 10 mil pequenos produtos está fora do CAR.
A proposta é levar aos produtores do município, por intermédio do ABC, assistência técnica, capacitação e acesso ao crédito das tecnologias sustentáveis, reforça Fonseca. O plano nacional é estruturado em seis ações: recuperação de pastagens degradadas; integração lavoura-pecuária-floresta (iLPF), sistema plantio direto (SPD), fixação biológica de nitrogênio (FBN), florestas plantadas (FP) e tratamento de dejetos animais. As linhas de crédito para essas atividades são disponibilizadas por meio do Programa ABC – braço executivo da política pública federal.
De setembro de 2011 para cá, 26.357 produtores de todo país já aderiam a alguma das seis tecnologias do ABC, informa Elvison Ramos. Nesse período, acrescenta, foram capacitadas 31.406 pessoas (70% técnicos, 20% produtores e 10% estudantes).
O plano também contabiliza a recuperação de 3 milhões de hectares de pastagens degradadas, a integração lavoura-pecuária-floresta de 451,8 mil hectares, o plantio direto em 2,8 milhões de hectares e uma área de 1,5 milhão de florestas plantadas.