O médico toxicologista Flávio Zambrone fez críticas à classificação da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), que incluiu o glifosato no grupo de substâncias “provavelmente cancerígenas para humanos”, ao defender o uso do herbicida no Brasil, durante audiência pública realizada no Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT-MT), nessa terça-feira (19).
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Zambrone afirmou que a classificação da IARC, feita em 2015, não considera a quantidade de exposição nem o risco real de cada substância, apenas registra se existe alguma evidência de potencial de risco. Ele lembrou que, na mesma lista do glifosato, aparecem batata frita, carne vermelha, bebidas quentes e até a malária.
Ele apontou que o fato de o glifosato estar listado com elementos tão distintos não significa que ele cause câncer, e sim que, em determinadas condições e em alguns estudos, houve indícios que justificaram uma observação maior.
“Na mesma lista em que está o glifosato, estão batata frita, carne vermelha, bebidas quentes e até a malária. Isso não significa que esses elementos sejam equivalentes ou que, inevitavelmente, causem câncer. Se fosse assim, teríamos que proibir o mosquito da malária. O que a agência faz é apontar hipóteses de risco em determinadas condições, mas não apresenta conclusões definitivas”, explicou.
O médico reforçou que diversas agências regulatórias internacionais de referência, incluindo Estados Unidos, Canadá, Japão, União Europeia, Austrália, Nova Zelândia e a própria Anvisa, reavaliaram o glifosato nos últimos anos e não encontraram evidências de que ele cause câncer.
“Todas essas entidades concluíram que não há risco de carcinogênese. A única classificação diferente veio do IARC, que enquadrou o glifosato no grupo 2A, o mesmo em que estão incluídos hábitos cotidianos como beber café muito quente, trabalhar à noite ou consumir carne vermelha”, disse.
Zambrone explicou que o glifosato tem baixa toxicidade para humanos, porque age em uma via metabólica presente em plantas, mas não existe no corpo humano. Segundo ele, o problema está no uso errado do produto. “Quando aplicado corretamente, o glifosato é seguro. Proibi-lo abriria espaço para alternativas mais tóxicas e menos estudadas, causando prejuízos sociais, econômicos e até à saúde pública”, afirmou.
Na mesma audiência, o engenheiro-agrônomo José Otávio Mentem, professor sênior da Esalq/USP, destacou que o glifosato foi essencial para a modernização do campo e para que o Brasil se tornasse potência na produção de grãos. Ele argumentou que a proibição do herbicida teria impacto direto na competitividade da agricultura, elevando custos e reduzindo produtividade.
“O glifosato é essencial para controlar plantas daninhas em culturas como soja, milho e algodão. Sem ele, os agricultores teriam que usar herbicidas mais caros, mais tóxicos e que duram mais no meio ambiente, o que encareceria a cesta básica e reduziria nossa competitividade internacional”, disse.
Mentem ressaltou que o glifosato não é perigoso por si só, e que o risco depende da forma de aplicação. Práticas agrícolas modernas, como cabines de pulverização fechadas, preparo de caldas pronto e o uso obrigatório de equipamentos de proteção individual (EPIs), reduzem a exposição dos trabalhadores.
Ele também alertou que a retirada do produto obrigaria os agricultores a recorrerem a herbicidas mais caros, mais tóxicos e de maior persistência ambiental, elevando os custos de produção e impactando diretamente o preço dos alimentos.
“Além de reduzir a produtividade, isso encareceria a cesta básica e diminuiria a competitividade do Brasil no mercado internacional. Estamos falando de um setor que responde por 50% das exportações nacionais e emprega 30% da força de trabalho”, ressaltou.